E mudava toda semana.
Sempre pegava o ônibus naquele horário de quinze pras dez da noite, muito perfumado, banhado, de calça de flanela e camisa sem manga. E o tijolão debaixo do braço. E era só Grande Clássico da Literatura Universal: Tolstoi, Machado, Dostoievski, Hemingway, Stendhal. O trocador desconfiava de que aquilo era pretexto, ou melhor, pré-texto, pra posar de intelectual e garantir papo com a primeira universitária arrumadinha que sentasse no banco ao lado. E aquele monte de músculo lá sabia ler!
Talvez os livros não servissem só de enfeite, ou talvez tudo aquilo se tratava de mais algumas peripécias de um sujeito de boa lábia. Cassandra, Helena, Mônica, Sandrinha, Érica ou Nádia se aproximaram muito do rapaz perfumado de pouco antes das dez da noite. A conversa iniciava sobre Natasha Rostova ou Julien Sorel. Depois trocava-se celulares e uma promessa de se encontrar naquele ônibus, naquele mesmo horário.
Era só estratégia? Ninguém sabia. Mas todo aquele jogo parecia funcionar muito bem com as jovens garotas que sentavam ao lado do morenão. Estratégia mesmo devia ser carregar aqueles livros, com aquele porte físico, num ônibus que tinha como rota o campus de humanidades da universidade federal, duas universidades particulares e um núcleo de línguas estrangeiras. Certamente não faltaria companhia para puxar assunto com a máxima bem piegas: “você acha que a Capitu traiu mesmo Bentinho?”.
Um comentário:
Eu acho que traiu. He.
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