segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Comédias da universidade pública

Todo mundo sabe que a universidade pública brasileira é um imenso museu de esquerdismo festivo. Se você não sabe, ou acha a idéia absurda, é porque o negócio já está tão arraigado que reconhecê-lo é tarefa impossível. Reconhecer algo significa conhecer o seu oposto.

Poucas coisas são tão divertidas pra mim quanto assistir de camarote ao espetáculo da galerinha acadêmica em ação tendo a consciência de que tudo não passa de pura canastrice intelectual. Eu até compreendo o automatismo ingênuo dos mais jovens; eles só querem parecer bacanas, é normal da idade. Hilário é ver cinqüentões desempenhando o papel de idiotas vaidosos com tanto gosto.

Semana passada, uns professores universitários pró-Cuba (desculpe a redundância) promoveram mais uma sessão de apologia ao comunismo. Tudo bem. Senhores de meia-idade vivenciando suas utopias adolescentes residuais inspiram uma certa compaixão. Mas não consigo deixar de ficar abismado com a contradição ambulante que essas figuras personificam. Vejamos:

Depois de quase ejacular exaltando a “poesia” da vida cubana, o sujeito muda o tom ao comentar a já clássica matéria da Veja. Coito interrompido. A angústia em seu rosto é comovente. Tiraram o pirulito da boca do menino. A ameaça saiu naquele tom sério de quem solta pedacinhos da palavra divina:

“Olha, o que a edição porca daquela revista fez com o Che, uma pessoa que é um ícone... Merecia mais do que ser queimada, como fizeram naquele protesto em São Paulo. Sei não, viu? Merecia outras medidas”.

Ah, as outras medidas! Instantes depois de quase chorar falando de liberdade, o imbecil manda os jornalistas da Veja pro calabouço. Trata-se da liberdade peculiar dos fanáticos: a liberdade de só falar o que agrada. Tente mostrar a um pilantra desses a imensa contradição e ele responderá usando dialética marxista, essa mãe que salva todos aqueles flagrados pregando uma coisa e praticando outra.

Note que fui ainda fui gentil ao supor que, para o cidadão acima, é a cadeia o destino de quem comete o crime de escrever matérias contra-revolucionárias. Certamente a solução “poética” é o paredão mesmo. Acho que ele hesitou em dizê-lo com todas as letras por algum pudor pequeno-burguês...

E no que ele difere de extremistas religiosos ao dar como atestado do crime o desrespeito a uma figura “icônica”? É isso aí! Vamos jogar esses hereges na fogueira! Che é grande!

Mas o poeta não brilhou sozinho. Ele perdeu o prêmio “Incoerência de Ouro” para uma senhora cujo nome não citarei, até porque a identidade não importa: considero-a um resumo da embromação geral. Jeitão descolado de quem endurece sem perder a ternura, terminou o discurso com a revelação bombástica: “Não há felicidade sob o capitalismo”. A platéia vibrou. Enquanto não ria nem batia palmas, meditei. Quanto ganha um professor universitário cheio de mestrados, doutorados e outros ados? Desconheço o valor exato, mas sei que é dinheiro pra caralho. É, digamos, um pouquinho mais do que ganha qualquer cubano – fora do Partido Comunista, claro. Então saí do estado meditativo e fui tomado pela mais completa felicidade. Descobri um jeito de salvar aquela pobre alma do inferno capitalista. Vou sugerir à doutora que transfira seus rendimentos para a minha conta. Melhor pra todo mundo: ela alcança o nirvana, eu fico estribado.

***

Mais comédias de universidade em breve.

5 comentários:

Yuri Leonardo disse...

Se fizer isso, Bruno, ela vai te responder usando a dialética marxista... :D

Roberta Felix disse...

Bruno, eu te vejo dizendo isso e fico pensando: esse rapaz tem velhice precoce. Enquanto alguns professores meio-seculares estão aí fazendo esses discursos que esquecem a realidade; tu já passou deles foi muito, deixou pra trás a fase de jovem ingênuo que quer impressionar.

Velhice lúcida a sua. E tudo num corpinho de vinte! Que beleza :D

Henrique Araújo disse...

isso tem tudo pra virar uma promissora série de textos escandalosamente engraçados e, por que não, lúcidos...

Débora Medeiros disse...

O pior é que eles ganham mais que um cubano, mesmo ganhando uma mixaria... Isso, claro, se não exercerem cargos administrativos.

O poder, qualquer que seja ele, não só embevece, como enriquece :P

Anônimo disse...

A juventude universitária diz ser ela própria a referência de intelectualidade no Brasil. Até aí, tudo bem. O problema inicia-se quando ela passa a, efetivamente, acreditar nisso. Aí, Direita, a coisa fode.